TEXTO ÁUREO
“E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus.” (Fp 4.7).
VERDADE PRÁTICA
Acima de todo e qualquer método humano, devemos confiar em Deus, único que pode nos dar a verdadeira paz e guardar nossos sentimentos.
LEITURA BÍBLICA EM CLASSE
Filipenses 4.4-7; Mateus 9.36; João 11.35,36.
INTRODUÇÃO
O homem é, essencialmente, um ser pensante, afetivo, volitivo (vontade) e livre: pensa, sente, deseja e age. Na lição anterior estudamos a respeito dos pensamentos. Vimos como eles podem influenciar os sentimentos e a vontade, e refletir em nossas decisões. Nesta lição abordaremos a parte afetiva do ser humano, buscando definir e diferenciar emoções e sentimentos e compreender sua importância na experiência humana e espiritual.
Palavras-Chave:
EMOÇÕES e SENTIMENTOS
I. O HOMEM, UM SER AFETIVO
1. Propósitos do estudo.
Há um evidente e preocupante agravamento da crise de saúde mental em todo o mundo, inclusive no Brasil. Transtornos depressivos e de ansiedade são os que mais crescem. Como já ressaltado, uma compreensão correta do ser humano, à luz da Palavra de Deus, é fundamental para uma vida integralmente equilibrada. Isso inclui entender (1) o que são emoções e sentimentos e como podem e devem ser geridos, (2) qual a conexão existente entre o que pensamos e o que sentimos e (3) qual a relação desses fenômenos com a vontade e as decisões humanas: Pensar, sentir, desejar e agir. Nada em nós deve estar fora do propósito de amar a Deus, servi-lo e adorá-lo (Sl 103.1; Mc 12.30).
A crescente incidência de transtornos depressivos e de ansiedade revela um profundo desequilíbrio interior que afeta todas as áreas da vida. Diante desse cenário, é indispensável que o cristão busque compreender o ser humano à luz da Palavra de Deus, pois somente ela revela o propósito divino para a mente, as emoções e a vontade. O salmista expressa esse entendimento ao declarar: “Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e tudo o que há em mim bendiga o seu santo nome” (Sl 103.1). Essa afirmação mostra que todas as faculdades humanas — pensar, sentir e agir — devem estar direcionadas para o louvor e o serviço ao Criador.
As emoções e os sentimentos são dádivas concedidas por Deus, criadas para enriquecer nossa experiência de vida e fortalecer nossos relacionamentos.
Contudo, quando não são guiados pelo Espírito Santo e pela verdade das Escrituras, podem tornar-se fontes de desequilíbrio e sofrimento. A Bíblia ensina que o coração humano é enganoso (Jr 17.9), por isso o cristão precisa aprender a discernir suas emoções e submetê-las à vontade divina. Paulo exorta os crentes a não se conformarem com este mundo, mas a serem transformados pela renovação da mente (Rm 12.2). Isso mostra que o domínio das emoções começa com a renovação do pensamento, moldado pela verdade de Deus.
Existe uma íntima ligação entre o que pensamos e o que sentimos. Pensamentos alimentados por incredulidade, medo ou amargura produzem emoções negativas que enfraquecem o espírito e abrem espaço para a ansiedade e a tristeza. Por outro lado, pensamentos firmados na Palavra geram fé, esperança e paz. Filipenses 4.8 orienta-nos a pensar em tudo o que é verdadeiro, justo e puro, pois a mente ocupada com as verdades do Evangelho experimenta estabilidade emocional. A Bíblia, portanto, não ignora os sentimentos humanos, mas ensina a direcioná-los corretamente para que se tornem instrumentos de adoração e comunhão com Deus.
A vontade humana também desempenha um papel essencial nesse processo. Cada decisão reflete a quem estamos servindo: a Deus ou aos desejos da carne.
Quando o cristão escolhe obedecer ao Senhor, mesmo em meio às lutas internas, o Espírito Santo fortalece sua mente e coração, produzindo domínio próprio e serenidade. Jesus ensinou que o maior mandamento é amar a Deus de todo o coração, de toda a alma, de todo o entendimento e de todas as forças (Mc 12.30). Esse amor integral envolve o controle das emoções, o direcionamento dos pensamentos e a rendição da vontade ao propósito divino.
2. Afetividade: emoções e sentimentos.
De forma simples, a afetividade é a nossa capacidade de sentir e demonstrar emoções e sentimentos. Esses processos envolvem tanto o nosso corpo quanto a alma (Sl 31.9), e também o espírito (Jo 13.21; Lc 1.47). A Bíblia nos mostra que somos seres completos — corpo, alma e espírito — e que nossas emoções e sentimentos fazem parte da nossa natureza, criada por Deus. Podemos entender melhor assim: a) Emoções: são reações rápidas e geralmente acontecem sem a gente pensar, como por exemplo, quando sentimos medo ou alegria de repente; b) Sentimentos: por outro lado, são mais duradouros, eles nascem das emoções, mas permanecem por mais tempo e são percebidos de forma mais consciente, como por exemplo, quando sentimos gratidão ou solidão.
A principal diferença é que a emoção passa rápido, tem pouca duração e é intensa; o sentimento é menos intenso, mas pode perdurar bastante tempo (Mt 26.38; Gn 47.9; Rm 9.2). Como servos de Deus, precisamos aprender a lidar com nossas emoções e sentimentos, buscando equilíbrio através da Palavra de Deus e da ação do Espírito Santo em nossa vida.
Jesus, perfeito em santidade, manifestou emoções humanas como tristeza, compaixão e alegria (Jo 11.35; Mc 1.41; Lc 10.21). Isso demonstra que as emoções e os sentimentos não são pecaminosos em si, mas precisam ser orientados pela vontade de Deus para que cumpram seu propósito: aproximar-nos do Criador e das pessoas.
A Palavra de Deus mostra que somos seres integrais — corpo, alma e espírito — e que nossas emoções fluem dessas três dimensões da existência. Quando o salmista declara: “Tem misericórdia de mim, Senhor, porque estou angustiado; consumidos estão de tristeza os meus olhos, a minha alma e o meu ventre” (Sl 31.9), ele reconhece que a dor emocional afeta também o corpo físico. Já Maria, ao dizer: “O meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” (Lc 1.47), expressa uma alegria espiritual que nasce de sua comunhão com o Senhor. Isso mostra que o equilíbrio emocional do cristão depende de sua comunhão com Deus e da submissão de todas as suas emoções à direção do Espírito Santo.
As emoções são respostas imediatas aos estímulos que recebemos, tanto positivos quanto negativos. Elas surgem rapidamente e, em geral, têm curta duração. Já os sentimentos são mais profundos e duradouros, resultantes da forma como interpretamos e guardamos essas emoções. Quando Jesus declarou: “A minha alma está cheia de tristeza até à morte” (Mt 26.38), Ele demonstrou um sentimento que nasceu de uma emoção profunda diante da cruz. Do mesmo modo, Jacó, ao olhar para sua vida, afirmou: “Poucos e maus foram os dias dos anos da minha peregrinação” (Gn 47.9), revelando o peso emocional acumulado pelas experiências difíceis.
Esses exemplos mostram que emoções e sentimentos influenciam nossas decisões e percepções da vida, podendo nos conduzir à maturidade espiritual ou ao desânimo, dependendo de como as administramos.
O apóstolo Paulo também expressou sua afetividade ao dizer: “Tenho grande tristeza e contínua dor no meu coração” (Rm 9.2), revelando um sentimento de compaixão pelos seus irmãos israelitas. Essa dor, longe de afastá-lo de Deus, o impulsionava à intercessão e à pregação do Evangelho. O mesmo deve ocorrer conosco. Nossas emoções, quando entregues ao Senhor, se tornam instrumentos de amor, misericórdia e serviço. Mas quando são deixadas sem controle, geram ciúmes, ira e ressentimento, frutos da carne que afastam o homem da paz espiritual (Gl 5.19-21).
Por isso, o cristão precisa buscar equilíbrio emocional através da Palavra e da ação do Espírito Santo. A Bíblia ensina que o fruto do Espírito inclui o domínio próprio (Gl 5.22-23), ou seja, a capacidade de administrar sentimentos e reações de maneira que glorifiquem a Deus. Meditar nas Escrituras, orar e cultivar comunhão constante com o Senhor são atitudes que fortalecem a alma e acalmam o coração. Quando nossas emoções são guiadas pela fé e não pelas circunstâncias, encontramos serenidade mesmo em meio às tempestades.
3. Principais afetos.
Alegria, medo, raiva, surpresa, nojo e tristeza são as seis emoções básicas. Quando ocorrem, provocam alterações corporais, como coração acelerado, respiração ofegante, tensão muscular, secura na boca e náuseas. Adão expressou alegria ao acordar e contemplar Eva (Gn 2.23), emoção que se tornou um sentimento igualmente prazeroso durante a feliz convivência que tiveram, plena de cumplicidade (Gn 2.25). Depois do pecado, experimentaram vergonha e medo, duas emoções negativas ou desagradáveis. Dentre as reações externas imediatas ocorreram a percepção da nudez, cobrir o corpo e se esconder de Deus (Gn 3.7-10). Tristeza e dor se tornaram sentimentos constantes na vida do primeiro casal (Gn 3.16-18). A tragédia da expulsão do Éden certamente lhes causou profunda frustração e angústia (Gn 3.23).
As emoções não surgiram após o pecado, mas fazem parte da constituição original do ser humano. O próprio Deus é descrito nas Escrituras como alguém que se alegra, sente compaixão, ira e tristeza (Sf 3.17; Mc 3.5; Ef 4.30).
Isso mostra que as emoções, em si mesmas, não são pecaminosas, mas precisam ser administradas à luz da santidade e da vontade divina. O pecado, porém, distorceu essas expressões, fazendo com que sentimentos originalmente bons se transformassem em fontes de sofrimento e desequilíbrio.
A narrativa de Gênesis 2 e 3 ilustra claramente essa realidade. Adão, ao despertar e ver Eva, expressou alegria e encantamento, reconhecendo nela a perfeita companheira que Deus lhe concedera (Gn 2.23). Essa emoção gerou um sentimento de amor, comunhão e prazer, evidenciado pela relação harmoniosa entre ambos (Gn 2.25). No entanto, após a desobediência, o medo e a vergonha tomaram lugar da alegria e da paz. A consciência do pecado provocou reações corporais e comportamentais imediatas: perceberam sua nudez, esconderam-se e tentaram se justificar diante de Deus (Gn 3.7-10). A partir desse momento, emoções que antes expressavam harmonia passaram a refletir a ruptura do relacionamento com o Criador.
Entre as emoções básicas que fazem parte da experiência humana, a alegria, o medo, a raiva, a surpresa, o nojo e a tristeza se manifestam em diferentes intensidades e contextos.
Todas elas provocam respostas físicas perceptíveis: aceleração do coração, respiração ofegante, tensão muscular e até reações digestivas. Esses sinais mostram que as emoções afetam o corpo e a mente de forma integrada. Entretanto, a forma como reagimos a essas emoções é o que determina se teremos saúde emocional ou se abriremos espaço para o desequilíbrio espiritual.
A alegria, quando brota de um coração grato e submisso a Deus, é uma força que renova e fortalece. Neemias declarou: “A alegria do Senhor é a vossa força” (Ne 8.10), lembrando que o contentamento espiritual não depende das circunstâncias, mas da comunhão com o Criador. Já o medo pode ter dupla função: proteger ou paralisar. O temor do Senhor é o princípio da sabedoria (Pv 9.10), pois conduz à prudência e à reverência; mas o medo sem fé gera fuga e desesperança, como aconteceu com Adão e Eva ao se esconderem de Deus.
A raiva, por sua vez, é uma reação emocional legítima diante da injustiça, mas deve ser controlada. Paulo orienta: “Irai-vos, e não pequeis” (Ef 4.26). Isso significa que o cristão pode sentir indignação, mas não deve permitir que esse sentimento o domine, levando-o à amargura ou vingança. A tristeza também tem seu valor espiritual. Paulo afirmou que a “tristeza segundo Deus” produz arrependimento para a salvação (2Co 7.10). Quando levada ao Senhor, a dor se transforma em crescimento e restauração.
4. Inveja, ira e ódio.
Em Caim também se observa a presença de emoção e sentimento. Sua ira em relação a Abel ficou estampada em seu rosto, um claro exemplo de reação fisiológica (Gn 4.6). Mesmo advertido por Deus, permitiu que a emoção se transformasse em um sentimento de ódio e matou o irmão (Gn 4.8). Outros sentimentos negativos, como culpa e medo, o acompanhariam por toda a vida (Gn 4.10-14).
A princípio, Caim sentiu ira — uma emoção intensa e natural diante da rejeição da sua oferta por parte de Deus. No entanto, em vez de refletir e buscar compreender o motivo da reprovação, ele permitiu que a raiva se transformasse em inveja e, posteriormente, em ódio. Essa sequência mostra o poder dos pensamentos e das emoções quando não são controlados à luz da Palavra de Deus.
Deus advertiu Caim de forma direta: “Por que te iraste, e por que descaiu o teu semblante? Se bem fizeres, não haverá aceitação para ti?
E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta, e para ti será o seu desejo, e sobre ele dominarás” (Gn 4.6-7). O Senhor o alertou sobre o perigo de deixar que a emoção se tornasse pecado. A ira em si não é errada, mas quando alimentada com orgulho e ressentimento, abre espaço para o domínio do mal. Paulo reforça esse princípio ao escrever: “Irai-vos, e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira, nem deis lugar ao diabo” (Ef 4.26-27).
A inveja, por sua vez, é um sentimento corrosivo que nasce da comparação e do desejo de possuir o que pertence a outro. Tiago a identifica como uma raiz de confusão e toda obra perversa (Tg 3.16). Em Caim, a inveja foi alimentada pelo orgulho ferido e pela incapacidade de aceitar a correção divina. Ele não apenas desejou ter o favor que Abel recebeu, mas quis eliminar aquele que representava o motivo da sua frustração. Assim, o que começou como uma emoção de descontentamento transformou-se em um ato de rebelião e assassinato.
O ódio é o estágio final desse processo. Ele endurece o coração e apaga qualquer traço de compaixão. João afirma que “qualquer que aborrece a seu irmão é homicida” (1Jo 3.15), mostrando que, mesmo sem um ato físico, o ódio já representa morte espiritual. Caim, movido por esse sentimento, não apenas matou Abel, mas rompeu completamente sua comunhão com Deus. O resultado foi culpa, medo e isolamento. A voz divina ecoou em sua consciência: “Que fizeste?” (Gn 4.10). A partir daí, sua vida tornou-se marcada pela inquietação e pelo afastamento da presença do Senhor (Gn 4.12,14).
II. EMOÇÕES: EXPERIÊNCIA E CONTROLE
1. Reação e decisão.
Como reações instintivas, muitas emoções estão fora do controle humano. Em casos assim, não constituem um pecado em si mesmas. Mas é responsabilidade nossa decidir como agir diante de uma reação emocional. A frase do apóstolo Paulo “Irai-vos e não pequeis” (Ef 4.26) expõe essa verdade. Paulo aconselha os efésios controlarem a ira e não deixarem que os dominem, tornando-se um sentimento pecaminoso.
Permanecer irado é dar lugar ao Diabo e abrir caminho para terríveis pecados (Ef 4.27). A ira, portanto, é uma experiência emocional que deve ser repelida e jamais cultivada. Em Efésios 4.31 Paulo diz que devemos nos livrar de toda amargura, ira e cólera. Assim, admite-se a ira como emoção, mas não como sentimento. O verdadeiro cristão não pode alimentar emoções ruins, como a ira (Cl 3.5-8). Dizer “Eu sou assim mesmo!” para justificar arroubos emocionais e permanecer neles é negar a eficácia da obra de Cristo (Rm 8.13; 2Co 5.17).
O que diferencia o cristão maduro do homem carnal é a maneira como reage a essas emoções. A ira, por exemplo, é uma reação instintiva que todos podem experimentar, mas ela se torna pecado quando é alimentada e transformada em ressentimento, desejo de vingança ou ódio.
O apóstolo Paulo, ao instruir os crentes de Éfeso, deixa claro que o problema não está em sentir, mas em permanecer dominado pela emoção: “Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira” (Ef 4.26). Essa advertência mostra que a ira pode surgir, mas não deve permanecer, pois quando cultivada abre brechas espirituais que o inimigo utiliza para semear o pecado no coração.
O cristão deve, portanto, reconhecer suas reações emocionais, mas permitir que o Espírito Santo governe suas atitudes. O mesmo Paulo que admite a existência da ira também ordena: “Toda amargura, e ira, e cólera, e gritaria, e blasfêmia e toda malícia sejam tiradas dentre vós” (Ef 4.31). Ele não nega a emoção, mas ensina o caminho do domínio espiritual. O fruto do Espírito é justamente o que capacita o crente a responder de maneira equilibrada, com mansidão, paciência e domínio próprio (Gl 5.22-23). A transformação do comportamento começa quando se compreende que reagir com violência, vingança ou palavras impensadas é permitir que a carne prevaleça sobre o Espírito.
É comum ouvir justificativas como “eu sou assim mesmo”, usadas para desculpar atitudes impensadas, mas essa expressão não condiz com a nova vida em Cristo.
Aquele que nasceu de novo recebeu uma nova natureza e, portanto, não deve se conformar com os impulsos da carne. A regeneração em Cristo nos torna capazes de controlar as emoções e reagir de modo santo, pois “os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências” (Gl 5.24). O cristão precisa lembrar que a santificação envolve também o domínio das emoções, e que cada reação deve ser conduzida em submissão à vontade de Deus.
Quando a ira é controlada, evita-se o avanço de pecados maiores. Quantos lares, amizades e ministérios foram destruídos porque alguém deixou a emoção prevalecer sobre a razão espiritual! O conselho bíblico é claro: “Não te apresses no teu espírito a irar-te, porque a ira repousa no seio dos tolos” (Ec 7.9). A maturidade cristã se manifesta justamente na capacidade de refletir antes de reagir, permitindo que a paz de Deus governe o coração (Cl 3.15).
Portanto, sentir ira não é pecado, mas permitir que ela dirija as ações é sinal de imaturidade espiritual. O servo de Cristo deve aprender a responder com sabedoria e graça, deixando que o Espírito Santo molde suas emoções. Quando submetemos nossas reações ao governo divino, deixamos de ser escravos dos impulsos e passamos a viver como verdadeiras novas criaturas, refletindo o caráter de Cristo em cada decisão.
2. Emoção e pecado.
O fato de uma emoção ser instintiva não retira, de forma absoluta, seu caráter pecaminoso. Raiva, inveja, tristeza e outras emoções reiteradas podem ser expressões de pecados enraizados no coração. Uma pessoa orgulhosa, por exemplo, é muito suscetível a reações emocionais negativas, como ira, rejeição e outros comportamentos hostis às pessoas com quem convive. Nabal era um personagem assim: soberbo, mal-humorado e ingrato (1Sm 25.10,11). Sua insensatez lhe custou a vida (1Sm 25.36-38). Um coração altivo é muito propenso a emoções negativas e sentimentos facciosos (Pv 13.10; 21.24). Como Davi, devemos rogar a Deus que nos livre da soberba, para que ela não nos domine e leve a transgressões (Sl 19.13).
A natureza caída do ser humano pode transformar emoções em manifestações visíveis de pecados profundamente enraizados no coração.
A raiva constante, a inveja, a tristeza exagerada e a amargura persistente revelam que algo dentro da alma não está alinhado com os princípios de Deus. Jesus ensinou que “do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios, prostituições, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias” (Mt 15.19). Ou seja, o problema não está apenas na emoção que se manifesta, mas na fonte interior que a alimenta. Quando o coração está corrompido pelo orgulho, pelo egoísmo ou pela falta de perdão, as emoções tornam-se reflexos desse estado espiritual doentio.
O exemplo de Nabal é uma clara demonstração disso. Ele era um homem arrogante, insensato e ingrato, reagindo com hostilidade a Davi, que havia lhe feito o bem (1Sm 25.10,11). Sua reação não foi um simples impulso momentâneo, mas a expressão de um coração endurecido e dominado pela soberba. O resultado foi trágico: sua vida terminou de forma abrupta, mostrando que as emoções guiadas pelo pecado produzem destruição (1Sm 25.36-38). A altivez e a arrogância, segundo o livro de Provérbios, são fontes de contendas e motivo de queda (Pv 13.10; 16.18). Quando o orgulho ocupa o centro do coração, ele distorce a maneira como interpretamos as situações, levando-nos a reações desproporcionais, impulsivas e ofensivas.
Por outro lado, aquele que busca pureza interior aprende a discernir suas emoções e a submetê-las ao senhorio de Cristo.
O salmista Davi reconheceu sua fragilidade emocional e espiritual e fez uma oração que todo cristão deveria repetir: “Guarda também o teu servo da soberba, para que se não assenhoreie de mim; então serei sincero e ficarei limpo de grande transgressão” (Sl 19.13). Essa súplica revela o entendimento de que a soberba é uma raiz que, quando não arrancada, contamina o coração e gera uma série de emoções e atitudes pecaminosas.
É fundamental compreender que o domínio das emoções não se alcança apenas com força de vontade, mas pela ação do Espírito Santo. Ele é quem transforma o coração e produz o fruto do Espírito, que inclui mansidão, paz e domínio próprio (Gl 5.22-23). Quando o cristão permite que Deus governe suas emoções, passa a reagir com humildade, paciência e sabedoria. Assim, as emoções deixam de ser instrumentos do pecado e se tornam expressões de um coração transformado.
3. O aspecto positivo das emoções.
Mesmo desagradáveis, certas emoções nos trazem muitos benefícios. O medo é um exemplo. Quando sentimos esta emoção, o cérebro inicia um processo instantâneo de descarga de adrenalina, hormônio que põe o corpo em imediato movimento para luta ou fuga. Serve, portanto, como um ativador de nosso mecanismo de defesa. Sem essa emoção o corpo ficaria inerte, sem ação, totalmente vulnerável. Nossos afetos, portanto, podem ser direcionados para o bem ou para o mal. Foi tomado de uma justa indignação que Jesus expulsou os vendilhões do templo (Mt 21.12). Muitas outras emoções o Mestre expressou durante sua vida e ministério (Mt 9.36; Jo 11.35,36; Mc 3.5).
Mesmo aquelas emoções que parecem desagradáveis, como o medo, a tristeza ou a indignação, podem ter um aspecto positivo quando bem direcionadas.
O medo, por exemplo, é uma reação natural que Deus implantou no homem como mecanismo de proteção. Diante de uma ameaça, o corpo reage liberando adrenalina, preparando-se para fugir ou lutar. Essa resposta fisiológica é fundamental para a preservação da vida. Se o ser humano não sentisse medo, colocaria-se em situações de risco desnecessário e agiria com total imprudência. Assim, o medo, quando equilibrado, não é um inimigo, mas um aliado.
No campo espiritual, há também o “temor do Senhor”, que é o princípio da sabedoria (Pv 9.10). Diferente do medo comum, esse temor é reverência, respeito e reconhecimento da soberania divina. Ele nos preserva do pecado e nos conduz à obediência. Portanto, podemos dizer que tanto no âmbito físico quanto no espiritual, o medo, quando corretamente compreendido, é uma emoção que protege e conduz o homem ao bem.
Além disso, outras emoções podem gerar reações justas e necessárias. Jesus, em sua humanidade perfeita, também experimentou diversas emoções.
Ele se indignou diante da profanação do templo, demonstrando uma ira santa e equilibrada (Mt 21.12). Essa reação não foi fruto de impulsividade, mas de zelo pela casa de Deus. O mesmo Jesus também se comoveu profundamente diante da dor alheia (Mt 9.36) e chorou ao ver o sofrimento causado pela morte (Jo 11.35-36). Esses episódios mostram que as emoções, quando submetidas à vontade divina, se tornam instrumentos de compaixão, justiça e amor.
A Bíblia não nos orienta a reprimir as emoções, mas a controlá-las e direcioná-las corretamente. O apóstolo Paulo aconselha: “Alegrai-vos com os que se alegram e chorai com os que choram” (Rm 12.15). Isso significa que a sensibilidade emocional é parte da vida cristã equilibrada. O problema não está em sentir, mas em deixar que as emoções dominem as atitudes e decisões. Quando guiadas pelo Espírito Santo, elas nos tornam mais humanos, mais compassivos e mais semelhantes a Cristo.
III. SENTIMENTOS GUARDADOS POR DEUS
1. A falsa autonomia humana.
Como em tantas outras áreas da vida, no aspecto das emoções e dos sentimentos muitos têm preferido acreditar em sua própria capacidade. O mercado está cheio de conteúdos sobre inteligência emocional e gestão emocional. São diversas as técnicas com as quais se promete o reconhecimento, a compreensão e o controle não somente das próprias emoções, mas também das dos outros. Não podemos negar alguma eficácia de métodos coerentes de ajuda ao ser humano nesse tão complexo processo. Todavia, é enganoso e perigoso acreditar no fantástico controle que alguns “mestres” das emoções prometem. Não raro se surpreendem com seus próprios fracassos, na inglória empreitada de serem emocionalmente invencíveis (Jr 17.5,9).
A cultura moderna valoriza a ideia de que o ser humano pode, por si só, dominar suas emoções, curar suas feridas interiores e alcançar um equilíbrio perfeito apenas com técnicas e força de vontade.
Livros, cursos e palestras sobre “inteligência emocional” e “autogestão emocional” multiplicam-se, prometendo controle absoluto sobre sentimentos e reações. No entanto, ainda que certas práticas tenham algum valor prático e possam auxiliar no autoconhecimento, é um erro acreditar que o homem pode alcançar plena estabilidade emocional sem a ajuda de Deus.
A Bíblia ensina que o coração humano é enganoso e corrupto (Jr 17.9), e por isso não pode ser plenamente confiável. Quando o homem se baseia apenas em sua própria capacidade, ignora a natureza caída e o pecado que habita em seu interior. O profeta Jeremias declara: “Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do Senhor” (Jr 17.5). Essa advertência mostra que a autoconfiança desmedida é um desvio espiritual perigoso. Em vez de depender da orientação do Espírito Santo, o homem passa a confiar em métodos humanos e filosofias seculares, acreditando que pode, por si só, vencer as tempestades internas da alma.
A verdadeira sabedoria emocional não vem de técnicas modernas, mas de uma vida guiada por Deus. O apóstolo Paulo ensina que o “fruto do Espírito é amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança” (Gl 5.22-23).
Essas virtudes, que envolvem o domínio próprio e o equilíbrio emocional, não são resultados de esforço humano isolado, mas da ação transformadora do Espírito Santo no coração do crente. Somente Ele é capaz de purificar as intenções, curar feridas emocionais e moldar sentimentos conforme a vontade divina.
Portanto, a solução para o desequilíbrio emocional não está em rejeitar completamente o estudo das emoções, mas em reconhecer que o verdadeiro controle vem de uma vida rendida a Deus. É no relacionamento com o Criador que o homem encontra descanso para a alma e sabedoria para lidar com seus sentimentos. Jesus mesmo convidou: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28). A paz interior, tão buscada pelo mundo, é fruto da presença de Cristo no coração, e não da mera força da mente humana.
Confiar em Deus e submeter as emoções ao Seu domínio é o caminho seguro para a verdadeira estabilidade. O homem que busca essa comunhão não precisa fingir que é invencível, pois sabe que sua força está em depender inteiramente do Senhor.
2. Obediência, humildade e oração.
Em Filipenses 4.7 Paulo se refere ao processo sobrenatural de guarda de nossos corações e sentimentos, que ocorre através da paz de Deus, que excede todo o entendimento. Mas isso somente acontece quando vivemos em abnegação, obediência e humildade, no modelo de Cristo (Fp 2.3-8). O apóstolo exorta os crentes de Filipos a terem o mesmo amor, o mesmo ânimo e o mesmo sentimento, renunciando os interesses pessoais (2.2-4). Quando há esta disposição interior e uma permanente confiança no cuidado divino, demonstrada através de orações e súplicas e um coração agradecido, cumpre-se o que o apóstolo Paulo anuncia no versículo 7: a paz de Deus guarda nossos corações e sentimentos em Cristo Jesus (Fp 4.7).
O apóstolo Paulo ensina que a paz de Deus — aquela que “excede todo o entendimento” — é quem guarda o coração e os sentimentos dos crentes (Fp 4.7).
Essa paz não vem de técnicas humanas de controle emocional, mas é resultado de uma entrega completa à vontade de Deus. Ela nasce em um coração que reconhece sua dependência do Senhor e busca n’Ele refúgio em todas as circunstâncias.
Em Filipenses 2.3-8, Paulo apresenta o exemplo supremo de Cristo, que, mesmo sendo Deus, se humilhou, tornando-se obediente até a morte de cruz. Essa humildade e submissão são o alicerce da verdadeira paz interior. Aquele que se humilha diante de Deus reconhece que não tem domínio absoluto sobre suas emoções, mas permite que o Espírito Santo o conduza e o transforme. O orgulho e a autossuficiência afastam o homem da comunhão com Deus e o tornam refém de seus próprios sentimentos; mas a humildade abre caminho para a graça divina agir (Tg 4.6).
Além da obediência e da humildade, Paulo destaca a oração como um meio essencial para o equilíbrio do coração.
Ele diz: “Não estejais inquietos por coisa alguma; antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças” (Fp 4.6). A oração é o canal por meio do qual depositamos nossas ansiedades e emoções nas mãos do Senhor. Quando oramos, reconhecemos que não temos controle sobre todas as situações, mas confiamos naquele que governa tudo com sabedoria e amor.
Essa atitude de entrega e gratidão é o segredo para experimentar a paz que o mundo não pode dar (Jo 14.27). O coração agradecido não se deixa dominar por murmurações nem por sentimentos de revolta, mas aprende a descansar em Deus, mesmo em meio às adversidades. Assim, a obediência gera confiança; a humildade abre espaço para a ação do Espírito Santo; e a oração mantém viva a comunhão com o Pai.
CONCLUSÃO
Não somos nós, com nossa própria capacidade, que dominaremos nossas emoções e sentimentos, mas sim o próprio Deus, se vivermos em humildade e fé, sob o domínio do Espírito (Gl 5.22).