
Subsidio Lição 1: Gálatas: a Carta da liberdade cristã | EBD- Jovens | Comentarista: Alexandre Coelho
TEXTO PRINCIPAL
“Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Jesus Cristo, para sermos justificados pela fé de Cristo […].” (Gl 2.16).
RESUMO DA LIÇÃO
A Carta aos Gálatas é uma exposição da salvação pela fé em contraste com a salvação pelas obras.
TEXTO BÍBLICO
INTRODUÇÃO
Ao longo deste trimestre, estudaremos a Carta de Paulo aos Gálatas. Escrita no primeiro século da nossa era, essa correspondência foi enviada aos crentes da região da Galácia e buscou mostrar aos seus leitores a importância da liberdade cristã e a suficiência do Evangelho. Eram homens e mulheres que haviam sido alcançados pela pregação e o ensino da salvação oferecida por Jesus, mas que, em algum momento, se deixaram levar por ensinos diferentes dos que haviam recebido, e estavam se afastando do plano de Deus para as suas vidas. Rever os ensinos do apóstolo nesta Carta pode nos fazer refletir a respeito da importância de valorizar o sacrifício de Jesus e não nos deixar levar por ensinos estranhos, que buscam colocar o esforço humano como um substituto à graça de Deus.
I. A CARTA AOS GÁLATAS
1. O contexto.
O Evangelho de Cristo se espalhou pelo Império Romano quando judeus e estrangeiros ouviram a sua mensagem e receberam Jesus em seus corações. Essa divulgação se deu pelo testemunho de irmãos judeus que fugiram de Jerusalém por conta da perseguição, mas também se deu por conta do trabalho específico de obreiros como Barnabé e Saulo, que foram enviados por Deus, e pela igreja, às nações gentias como missionários. Essa fase inicial da igreja é apresentada no livro de Atos dos Apóstolos. Mas a história da igreja não se resume aos relatos de Lucas, que inspirado pelo Espírito Santo, registrou os acontecimentos relativos às atividades missionárias. As cartas dos apóstolos também trazem informações que nos mostram outros acontecimentos nesse período.
Muitos gentios se tornaram cristãos, e com o aumento deles entrando na igreja, crendo que a salvação prometida por Cristo vinha pela fé, surgiu o que vamos chamar de “choque cultural”: um grupo de judeus, que também tinha crido em Jesus, passou a ensinar que a Salvação dependia também da guarda da Lei de Moisés. Jesus era judeu, e guardou a Lei, sujeitando-se a ela. Portanto, todos os seus seguidores deveriam também passar pelo mesmo rito. Esse grupo é denominado de judaizantes, e como veremos, deu trabalho por onde passava, pois seu ensino, de forma praticamente imperceptível aos gálatas, enfatizava o esforço humano como um auxiliar à graça de Deus.
O livro de Atos dos Apóstolos narra como, após a descida do Espírito Santo no dia de Pentecostes (At 2.1-4), a mensagem de salvação começou a se espalhar com poder e grande alcance. No início, o foco era Jerusalém, mas, com o aumento da perseguição — como vemos após o martírio de Estêvão (At 7.54–8.1) — muitos discípulos foram dispersos e, onde chegavam, levavam o Evangelho consigo (At 8.4). Essa dispersão não foi apenas geográfica, mas também cultural, pois o Evangelho começou a alcançar regiões fora da Palestina, chegando aos gentios, como foi o caso da conversão de Cornélio e sua casa (At 10).
Com o crescimento do número de convertidos gentios, surgiu um problema teológico e cultural: muitos judeus cristãos, ainda apegados às tradições mosaicas, acreditavam que os gentios também deveriam cumprir os rituais da Lei, como a circuncisão, a guarda do sábado e as regras alimentares.
Esse grupo ficou conhecido como os judaizantes, e sua doutrina acabou gerando confusão e divisão nas igrejas recém-estabelecidas. Paulo enfrentou diretamente essa heresia, especialmente na região da Galácia, onde os irmãos estavam sendo levados a crer que precisavam obedecer à Lei para serem salvos. Por isso, ele escreve com veemência: “Estais separados de Cristo, vós os que vos justificais pela lei; da graça tendes caído” (Gl 5.4).
Esse “choque cultural” envolvia mais do que costumes; era uma disputa pela essência do Evangelho. Os judaizantes, muitas vezes de forma sutil, misturavam a fé com a prática da Lei, como se o sacrifício de Cristo não fosse suficiente. Paulo reage com firmeza e clareza, ensinando que o Evangelho é completo em Cristo e que qualquer acréscimo à graça representa um outro evangelho, o qual ele condena severamente (Gl 1.6-9). Embora Jesus tenha cumprido a Lei em sua totalidade (Mt 5.17), isso não significa que seus seguidores devam seguir os ritos da antiga aliança como exigência de salvação, pois agora vivemos sob a nova aliança, selada com seu sangue (Hb 9.15).
2. O autor.
Paulo é o autor da Carta aos Gálatas. Ele se identifica como tal logo no primeiro versículo, não dando margem para que outra pessoa possa ser apresentada como responsável por essa autoria. Como veremos no decorrer das lições, sua autoridade apostólica foi questionada por um grupo de judeus. Por isso, colocar seu nome na carta que escreveu foi uma forma de se identificar com seus leitores e, os detalhes evidentes nela, mostram que Paulo conhecia os irmãos gálatas. Sobre a data da composição desse documento, tem sido comentado que a sua escrita se deu entre os anos 48 a 51 de nossa era.
O apóstolo Paulo é claramente o autor da Carta aos Gálatas, como ele mesmo afirma de forma direta logo na saudação inicial: “Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dos mortos)” (Gl 1.1). Essa introdução não serve apenas como uma apresentação formal, mas como uma declaração de autoridade e legitimidade espiritual. Ele faz questão de afirmar que seu apostolado não veio por meio de uma instituição humana, mas foi recebido diretamente por meio de uma chamada divina. Essa ênfase é compreensível, já que sua autoridade vinha sendo constantemente desafiada por certos judeus que tentavam desqualificá-lo diante das igrejas que ele havia fundado.
Ao escrever aos gálatas, Paulo não estava apenas defendendo sua posição pessoal, mas a verdade do Evangelho que havia recebido por revelação de Jesus Cristo (Gl 1.11-12).
Seus opositores, provavelmente os judaizantes, buscavam minar a confiança dos crentes, sugerindo que ele não era um verdadeiro apóstolo como os doze que andaram com Jesus. Eles usavam essa acusação como base para introduzir ensinos contrários à justificação pela fé. A resposta de Paulo, no entanto, é firme e respaldada tanto por sua experiência pessoal de conversão e chamado (At 9.1-15) quanto pelo reconhecimento que recebeu dos próprios apóstolos em Jerusalém, como ele relata em Gálatas 2.9.
Outro ponto importante é o tom pessoal e pastoral da carta, que mostra o quanto Paulo conhecia bem os irmãos da Galácia. Ele demonstra preocupação sincera com a condição espiritual deles e tristeza pela forma como estavam sendo influenciados por doutrinas estranhas. Isso fica evidente quando ele diz: “Meus filhinhos, por quem de novo sinto as dores de parto, até que Cristo seja formado em vós” (Gl 4.19). Não se trata de alguém distante ou indiferente, mas de um verdadeiro pai espiritual, angustiado com a possibilidade de seus filhos na fé abandonarem a verdade que haviam recebido.
3. O motivo da Carta.
A Carta aos Gálatas foi escrita com o objetivo de alertar aqueles crentes acerca do perigo que estavam correndo por acrescentar à mensagem do Evangelho a prática da Lei de Moisés. Eles já haviam crido nas Boas-Novas, e não era necessário agregar às suas vidas nenhum dos elementos da lei que Deus dera aos hebreus por ocasião da sua saída do Egito. Isso pode estar claro para nós, leitores do século XXI, mas para os crentes gálatas, não. Devemos nos lembrar de que no primeiro século havia circulado pelas igrejas pessoas que introduziam doutrinas diferentes das que eram ensinadas pelos apóstolos, e que por isso as igrejas precisavam ser lembradas do verdadeiro Evangelho e de suas práticas.
Deus usa o apóstolo Paulo, um homem de formação intelectual farisaica, mas devidamente convertido a Jesus, para orientar os leitores de que a Lei de Moisés havia sido dada por Deus aos hebreus, e não aos gentios. Como veremos posteriormente, a própria igreja de Jerusalém já havia traçado parâmetros para que o Evangelho fosse apresentado entre os gentios, sem a necessidade da circuncisão (At 15.28,29). A partir desse ponto, trataremos a palavra “circuncisão” como um sinônimo da guarda da Lei de Moisés.
O motivo central da Carta aos Gálatas foi a urgente necessidade de corrigir um desvio doutrinário que ameaçava a integridade do Evangelho pregado por Paulo.
Os crentes da Galácia haviam recebido a mensagem da salvação com alegria, reconhecendo que a justificação vinha unicamente pela fé em Jesus Cristo. No entanto, estavam sendo influenciados por pessoas que ensinavam que a fé em Cristo não era suficiente, e que era necessário também guardar a Lei de Moisés — especialmente o rito da circuncisão — para alcançar a salvação (Gl 5.2-4). Ao acrescentar obras da Lei à graça, esses falsos mestres estavam, na prática, anulando o sacrifício de Cristo.
É por isso que Paulo escreve com tanto zelo e autoridade, logo no início da carta, afirmando que estão se desviando para um “outro evangelho”, que na verdade não é outro, mas uma perversão do Evangelho de Cristo (Gl 1.6-7). A linguagem que ele utiliza ao longo da carta é firme e, em alguns momentos, até severa, porque a situação exigia urgência. Ele sabia que, se não confrontasse essa doutrina, o erro se espalharia ainda mais, afastando os irmãos da verdadeira liberdade em Cristo.
Os gálatas estavam sendo seduzidos por argumentos que apelavam à tradição e à religião dos judeus, e que pareciam espiritualmente corretos à primeira vista.
A Lei foi dada por Deus, e o próprio Jesus a cumpriu. No entanto, a questão aqui não era seu valor, mas sua aplicação na nova aliança. Paulo explica que a Lei teve seu papel, mas funcionou como um “aio”, um tutor que conduziu o povo até Cristo. Agora que Cristo veio, não estamos mais debaixo desse tutor (Gl 3.24-25).
A escolha de Paulo para tratar desse tema revela a sabedoria divina. Ele era fariseu e conhecia profundamente a Lei. Mas, após sua conversão, entendeu que a justificação vem de Deus, não dos méritos humanos (Fp 3.4-9). Por isso, fala com autoridade. Ele não se opõe à Lei, mas reconhece seu papel: revelar o pecado (Rm 3.20). Cristo veio para nos justificar e nos libertar da maldição da Lei (Gl 3.13).
Vale lembrar que esse assunto já havia sido tratado pela liderança da igreja em Jerusalém. Alguns queriam impor a circuncisão aos gentios. No concílio, guiado pelo Espírito Santo, decidiram que os gentios não precisavam guardar toda a Lei, apenas seguir princípios básicos para manter a comunhão com os judeus (At 15.28-29). Mesmo assim, o ensino legalista continuou a circular. Por isso, Paulo insiste em defender a verdade do Evangelho.
II. A SAUDAÇÃO PAULINA
1. Paulo, apóstolo, não da parte dos homens (v.1).
Paulo inicia a Carta aos Gálatas com a sua identificação nominal. Ele era conhecido pelos irmãos daquela região, e eles não teriam dúvida de quem era o autor da carta. Ele também acrescenta um título ao seu nome: apóstolo. Diferente de um título honorífico, ou que trouxesse a ideia de ser um obreiro diferenciado, apóstolo era um “enviado”, alguém que havia sido escolhido para levar uma mensagem. Era uma honra, mas igualmente uma grande responsabilidade, ser portador das Boas-Novas.
Ele completa com mais uma sentença: “não da parte dos homens”. Esse aspecto é importante, pois ele não teria escrito tais palavras se a sua autoridade apostólica não estivesse sendo colocada em xeque por seus acusadores, os judaizantes. Era necessário que ele mostrasse, o que ele faz, no texto mais à frente, que a sua chamada vinha de Deus. Se ele não andou junto com os apóstolos de Jerusalém, que autoridade teria para ser um apóstolo? Os judaizantes criam que se Paulo não fora enviado por Jerusalém, então não teria autoridade para ensinar, doutrinar ou falar de Jesus como quem foi comissionado para tais ações. É verdade que Paulo não andou com os Doze por ocasião do ministério terreno de Jesus, mas da mesma forma que os Doze, Paulo foi ensinado pelo próprio Jesus, como ele descreve (Gl 1.12).
Ao iniciar sua carta aos gálatas, Paulo se apresenta com firmeza e clareza: “Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai…)” (Gl 1.1).
Essa introdução não é apenas uma saudação formal, mas uma defesa direta e necessária de sua autoridade apostólica. O uso do termo “apóstolo” (apostolos, no grego) revela seu chamado como “enviado”, alguém comissionado diretamente por Deus para proclamar o Evangelho. A sua função não era meramente institucional, como se dependesse de uma nomeação humana, mas fruto de uma escolha divina, resultado do encontro sobrenatural que teve com Cristo no caminho de Damasco (At 9.3-6).
A afirmação “não da parte dos homens” responde de forma direta aos questionamentos feitos pelos judaizantes, que duvidavam da legitimidade de seu ministério. Para eles, a autoridade verdadeira viria somente de Jerusalém, da parte dos apóstolos que conviveram pessoalmente com Jesus. Eles afirmavam que, por Paulo não ter sido discípulo durante o ministério terreno do Senhor, sua mensagem deveria ser vista como inferior ou até mesmo suspeita. Mas Paulo rebate esse argumento logo de início, afirmando que sua chamada foi diretamente do céu. Como ele mesmo explica mais adiante na carta, “não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas pela revelação de Jesus Cristo” (Gl 1.12).
Paulo compreendia que ser apóstolo não significava status ou superioridade sobre os demais, mas envolvia profunda responsabilidade e submissão ao propósito de Deus.
Esse ponto inicial da carta é essencial para o que Paulo desenvolverá ao longo de sua argumentação. Ele precisava deixar claro, desde o começo, que seu ensino sobre a justificação pela fé, sem as obras da Lei, não era uma invenção pessoal nem uma adaptação cultural para agradar gentios. Era o próprio Evangelho de Cristo, revelado pelo Senhor ressurreto. Sua autoridade vinha do mesmo Cristo que comissionou os Doze, o mesmo Cristo que morreu e ressuscitou para nos dar salvação. Diante disso, rejeitar a mensagem de Paulo era, na prática, rejeitar o próprio Evangelho.
2. Da parte de Jesus e Deus Pai (v.1).
Após ter se apresentado como remetente da Carta, Paulo deixa claro a origem do seu apostolado: Ele vinha da parte de Jesus, e de Deus Pai, que ressuscitou a Jesus dentre os mortos. Em um único verso, ele destaca a atuação conjunta do Pai e do Filho, e o milagre da ressurreição do Senhor. Foi o Jesus ressuscitado que apareceu a Paulo quando ele se dirigia a Damasco, e sem essa ressurreição, Paulo não teria sido salvo, não teria se tornado um discípulo e não teria sido comissionado aos gentios.
Ele havia recebido a mensagem do Evangelho por revelação do Senhor Jesus, e isso nos mostra que as Boas-Novas têm origem divina. Essas Boas-Novas estavam em risco, e Paulo percebeu que os gálatas, mesmo sendo crentes, precisavam ser novamente ensinados acerca do Evangelho. Essa Carta é uma defesa do verdadeiro Evangelho para os gálatas, que já tinham experimentado a salvação, mas que estavam caindo da graça (Gl 5.4).
Logo no primeiro versículo de sua carta, Paulo afirma que seu apostolado é “por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos” (Gl 1.1).
Com isso, ele estabelece a origem divina da sua missão: ele não foi enviado por homens nem nomeado por instituições humanas, mas recebeu sua comissão diretamente do Cristo ressuscitado. Essa afirmação é profundamente significativa, pois conecta o ministério de Paulo à autoridade suprema de Deus Pai e de Seu Filho, Jesus Cristo. O apóstolo une, em uma mesma frase, duas verdades fundamentais: a divindade de Cristo e a realidade da ressurreição. Não é apenas uma introdução teológica, mas uma declaração poderosa de que tudo o que ele escreve se fundamenta no plano redentor de Deus.
Paulo também destaca que recebeu o Evangelho por revelação direta de Jesus Cristo (Gl 1.12), e não por tradição ou ensino humano.
3. Os irmãos que estão comigo (v.2).
Paulo tem a humildade de dizer que não está fazendo a obra de Deus sozinho. Mesmo não mencionando os nomes de seus companheiros de ministério, ele mostra aos gálatas que fazemos melhor a obra de Deus quando temos comunhão uns com os outros e podemos servir ao Senhor em um grupo de pessoas. Como um corpo, podemos ser úteis com diversos talentos.
A humildade de Paulo é perceptível ao reconhecer que ele não estava sozinho na missão.
A referência aos “irmãos” também transmite aos gálatas a ideia de que sua preocupação não era isolada. Outros cristãos, que também conheciam o verdadeiro Evangelho, compartilhavam do mesmo entendimento e estavam unidos em espírito com ele na escrita daquela carta. Ao fazê-lo, Paulo fortalece seu argumento contra os judaizantes, mostrando que não se tratava de uma divergência pessoal entre ele e outro grupo, mas de uma defesa coletiva do Evangelho revelado por Cristo.
4. Os destinatários.
Os destinatários dessa Carta eram os irmãos das “igrejas da Galácia” (Gl 1.2). Observe que esse documento não era para uma única igreja, como foram as Cartas aos Romanos, aos Coríntios e aos Efésios, cujos destinatários, como se entende, pertenciam a uma igreja localizada em uma única região. Os gálatas pertenciam a um grupo de igrejas.
A Galácia era uma região da Ásia Menor, hoje correspondente ao território central da atual Turquia. Durante suas viagens missionárias, Paulo fundou várias igrejas nessa região, como as de Antioquia da Pisídia, Icônio, Listra e Derbe (At 13.14–14.23). Essas igrejas foram estabelecidas com muito esforço, em meio a perseguições e desafios, e Paulo mantinha com elas uma relação pastoral profunda. Sua missão não era apenas plantar igrejas, mas também garantir que elas permanecessem firmes na doutrina de Cristo. Por isso, ao perceber que a influência judaizante ameaçava desviar aquelas comunidades da verdade do Evangelho, ele escreve com zelo, exortando todos os irmãos da Galácia a se manterem fiéis à mensagem da graça.
O uso do plural — “igrejas” — também mostra que a fé cristã, desde o princípio, não era um movimento isolado ou fragmentado.
Embora existissem várias comunidades locais, elas estavam unidas por uma mesma fé, por um mesmo Espírito e por um mesmo Senhor (Ef 4.4-6). As dificuldades enfrentadas por uma igreja interessavam a todas, pois faziam parte de um só corpo. Esse senso de coletividade é importante, especialmente quando se trata da defesa da doutrina. O erro, quando não é confrontado, não afeta apenas um grupo, mas tem potencial de corromper todo o corpo. É por isso que Paulo fala com tanta urgência e autoridade.
Além disso, ao escrever a diversas igrejas, Paulo mostra que a doutrina da graça, sem a necessidade das obras da Lei, não era apenas uma opinião teológica, mas a base inegociável do Evangelho. O desvio dos gálatas não era uma questão local, mas um perigo doutrinário que ameaçava o testemunho do cristianismo em uma região inteira. Paulo os chama à reflexão, lembrando-os do que haviam aprendido, vivido e experimentado pelo Espírito (Gl 3.1-5). Eles não podiam trocar o verdadeiro Evangelho por uma distorção religiosa que colocava novamente um jugo sobre os ombros dos crentes.
III. A MENSAGEM PARA OS NOSSOS DIAS
1. A importância da liberdade.
A Carta aos Gálatas defende a liberdade cristã. E que liberdade é essa? Liberdade de uma vida de santidade, de comunhão com Deus e acesso livre a presença dEle. A certeza de que não precisamos seguir as obras da Lei para sermos salvos, pois somos salvos pela fé em Jesus. Os gálatas haviam recebido o Evangelho pela fé, mas estavam sendo ensinados que a salvação dependia de uma série de observâncias dos costumes judaicos, o que era uma afronta à graça de Deus.
Os gálatas haviam crido no Evangelho pela fé. Tinham recebido o Espírito, experimentado a transformação interior e começado a caminhar na graça de Deus (Gl 3.2-3).
No entanto, estavam sendo influenciados por mestres que ensinavam que a fé, por si só, não bastava, e que era necessário também guardar os ritos da Lei — como a circuncisão, as festas e as dietas cerimoniais — para alcançar a salvação. Essa doutrina era uma afronta direta ao sacrifício de Cristo, pois sugeria que a cruz não era suficiente. Paulo, então, intervém com firmeza, afirmando que voltar à Lei como meio de justificação é rejeitar a própria graça: “Se sois circuncidados, Cristo de nada vos aproveitará” (Gl 5.2).
A liberdade que Paulo defende não é uma novidade teológica inventada por ele. É o cumprimento da promessa feita por Deus aos patriarcas e profetas, agora revelada plenamente em Cristo. A Lei teve seu papel, como ele mesmo explica: ela foi um aio, um tutor, até que viesse a fé (Gl 3.24). Com a vinda de Cristo, essa função se cumpriu. Permanecer debaixo da Lei após a cruz seria como insistir em viver como escravo, mesmo tendo sido libertado. A liberdade cristã, portanto, não é apenas um conceito bonito, mas uma realidade espiritual que altera totalmente a forma como nos relacionamos com Deus.
2. Nossa salvação não depende de nossas obras.
Nenhuma prática que venhamos a fazer tem a capacidade de trazer a Salvação ofertada por Deus em Jesus, ou o perdão dos pecados. A Carta aos Gálatas é um alerta contra qualquer ensino ou pregação que tente complementar o sacrifício de Jesus com obras feitas pelos homens. As obras, para o crente, são úteis para que Deus possa ser glorificado pelos ímpios que, vendo as nossas boas obras, percebam que elas são uma ação do Espírito em nós e que glorifiquem a Deus (Mt 5.16).
3. Os judaizantes.
Paulo desejava mostrar, na Carta aos Gálatas, que o sacrifício de Jesus foi único, perfeito e é suficiente para a nossa salvação. Isso foi necessário porque, havia o grupo dos que “não andavam bem e diretamente conforme a verdade do evangelho” (Gl 2.14) e que desejavam impor os “costumes” dos judeus sobre os gentios. Costumes esses que nem mesmo o apóstolo Pedro parecia observar.
A atuação dos judaizantes era sutil e, por isso, perigosa. Eles não negavam Jesus, mas tentavam ajustá-lo à tradição judaica, tratando o Evangelho como uma continuação da antiga aliança. Queriam moldar a fé cristã segundo a religião dos judeus, transformando a graça em um sistema de regras. Paulo não apenas refutou esse ensino, mas mostrou que até líderes da igreja, como Pedro, foram momentaneamente influenciados por essa pressão. Em Antioquia, Pedro se afastou dos gentios convertidos por medo dos da circuncisão, e Paulo o repreendeu publicamente por não agir “diretamente conforme a verdade do evangelho” (Gl 2.14). Esse episódio mostra a gravidade do problema e como até os apóstolos podiam tropeçar diante da pressão religiosa.
Em Cristo, não há judeu nem grego, servo nem livre; todos são um (Gl 3.28). A salvação não depende da etnia, do passado religioso ou da prática de leis cerimoniais, mas unicamente da fé em Jesus. Ao exigir que os gentios se sujeitassem à Lei, os judaizantes anulavam a cruz e construíam novamente o muro de separação que o próprio Cristo havia derrubado (Ef 2.14-16).
O ensino de Paulo é claro e definitivo: “não aniquilo a graça de Deus; porque, se a justiça provém da lei, segue-se que Cristo morreu debalde” (Gl 2.21). Essa declaração confronta toda e qualquer tentativa de misturar fé com mérito, graça com esforço humano. A justiça de Deus é revelada no Evangelho e se recebe pela fé, do começo ao fim (Rm 1.17). Os judaizantes, ao imporem os costumes, não estavam apenas errando na forma, mas corrompendo a essência do Evangelho. Por isso, Paulo escreve com firmeza, não para agradar aos homens, mas para permanecer fiel à verdade de Deus.
A atuação dos judaizantes na igreja primitiva serve de alerta à igreja atual. Sempre que alguém condiciona a salvação a regras humanas, costumes culturais ou tradições, repete o mesmo erro. O verdadeiro Evangelho é simples, profundo e libertador: Deus nos salva pela graça, por meio da fé (Ef 2.8). Paulo defendeu essa verdade com coragem, e nós também devemos proclamá-la com fidelidade.
CONCLUSÃO
Sempre teremos diante de nós o desafio de lembrar que a nossa salvação é recebida pela fé, e que não precisamos seguir rituais de outras culturas que se proponham a ser complementares à nossa salvação. Os gálatas precisaram ser ensinados de que a salvação não está vinculada às obras da Lei, pois o Evangelho é suficiente para nos salvar. A graça do Senhor é o que basta para a nossa salvação.